Abasteça sua mente.

O pé na boca do urso morto (único momento de abstração da sua famigerada voracidade), a hérnia de disco rangendo na sua lombar em virtude do sofá de toco de madeira. Ele pensa, espantando com a rapidez com que vem e vai o raciocínio, já superado o desespero da agilidade das idéias que de tão velozes parecem deixar a fala em câmera lenta na tentativa de oralizar sua viagem. Levanta-se (agora mais relaxado) e ao olhar pela janela de sua choupana, consegue alcançar algo essencial na utopia da felicidade de qualquer um:
Reparar na beleza contínua do corriqueiro que o cerca, em como ele alcança a satisfação no meio dessa floresta de coníferas onde está, como sua vida tomou os mais distintos rumos, coisas nunca imaginadas, mas que vieram tão fugazmente que não se teve um tempo para parar e analisar.Admira a neblina, e confuso não consegue perceber se ela vem dentre seus dedos ou do frio lá de fora. Lá de fora, porém o lago não congelou. Agora já de cabeça feita abre o valioso papel alumínio.
Em um ato no mínimo avulso, não menos estranho, tira seu minúsculo selo contemplando e admirando a colorida e, porque não, psicodélica imagem do Mickey nele impressa, pensando quais as possíveis origens de tais cores.
Como alguém pode ser infeliz em um lugar daqueles? Sorri e dedilha seu violão, tão acabado quanto ele próprio e com 2 cordas a menos, coloca sua fuga em cores no buraco do piercing e sente a língua dissolve-lo, voltando agora as atenções para o instrumento, mas sua mente sai buscando outros meios de tranqüilidade, lembrando paralelamente das suas antigas reflexões: Os faróis traseiros. Como viajava e abstraía o estresse do cotidiano da cidade apenas contemplando as quilométricas filas vermelhas, arte da prepotência e egoísmo humano, mas que, entretanto, canalizavam tão reconfortante e agradável fluxo de felicidade, ouvindo seu Tokyo Police Club. Cada um é cada um. E ele sabe disso. No meio da fila e cercado de luzes, ele sabe. Se encontrar não é momentâneo nem temporário. Nasceu com aquilo, se desperta algum dia e todos sabem onde são felizes, com quem ou como, mesmo ao negar, as marcas são únicas. Seu folk agora o impressiona, mandando agudos como Joni Mitchell, claves de sol. Agora nota: está oficialmente doçado. Suas minhocas superiores se agitam. Filosofar em torno da felicidade, com chorus ou reverb, embarca em sua “Magical Mistery Tour”. Acordes que enchem o peito como um tornado de O2. Amarelo, tudo pardo, seu ego se esconde rapidamente, 10 batidas por segundo, e a escuridão dá as caras. Jack Nicholson. Seu machado se aproxima à mesma medida em que acontecem os espasmos. Os olhos do machado estão fixos como se olhasse através de sua roupa, suas costelas, seus órgãos, sua alma. Tão esguia e sempre alerta, mas afinal a bad chega. Misturou algo? Não se lembra. Dopado? Foda-se, está louco mesmo. E sua floresta já virou tundra e sua choupana, barraca. O sofá agora é uma parte da lenha que o mantém aquecido, o urso é apenas a pele do coelho que jaz em seu estomago, em meio ao tetraidrocanabinol e á dietilamina de acido lisérgico. Hipogloss vem à mente e num rápido movimento ele saca a bisnaga da bolsa e enche sua boca com o creme que o leva a engasgar, tossir e voltar à época das matinês do Indaiá. Uma torrente de lembranças vem aos olhos. Nitidamente lembra da ASSAMCO, das fortalezas de cadeiras de mangueira, do episódio do short na escolha do time, do Ponto Frio, da educação física na quadra em frente, dos muitos Conan’s nas gavetas de aço verde-cinza, do Jaspion, Black Kamen Rider, Winspector, e tantas outras peraltices. De certo modo, sabe sim de onde veio toda a sua personalidade, atitudes, arrependimentos: da parte realmente boa da vida. E viva as luzes da cidade moderna, as imensas e barulhentas filas de carros, as coníferas, as tundras, os amigos, os doces, e tudo de confortante que suportou sua existência. E vomita tentando levantar. Para, deita e finalmente percebe a beleza da morte.



2 comentários:

Matteo Ciacchi disse...

que louco. QUE LOUCO HDAWOIUHDAOWID. Não sabia disso do hipoglós não, como faz?

Anônimo disse...

Rapaz, essas trips ainda vão te matar, seria uma perda terrível pro meio artístico.. mas afinal, os poetas sempre morrem de overdose. :/